Textos Críticos

Catálogos 1979/2018

Seja quando suas obras se referem ao mundo exterior, seja quando se referem a interiores – ou, nas palavras do próprio artista, ao mundo interior – o elemento dominante da pintura de Marcos Duprat é a luz, que ele apreende através do uso rigoroso da técnica tradicional da velatura. Esta consiste na produção da cor através da sobreposição, por transparências e acréscimos, de diversas camadas de tinta. Trata-se, como já observou, a propósito de uma exposição de Duprat, o grande crítico José Guilherme Merquior, de “uma pintura lenta, em adágio, propícia à meditação do duplo, à ponderação da série, à perquirição da profundidade”.

Assim, as pinturas de Duprat, como toda verdadeira obra de arte, são produzidas através de uma relação dialética – de amor e de luta – entre suas intenções iniciais e a atenção às exigências, aos caprichos e às sugestões da obra in fieri. A cada passo, ele se sente solicitado pela própria pintura a desenvolver novas soluções pictóricas, em função tanto das necessidades de cada situação imprevista quanto de oportunidades que antes não existiam. Duprat conhece profundamente a complexa relação entre o pintor, a matéria com a qual trabalha e a técnica que emprega. É sem dúvida ao uso sutil e criterioso da velatura que se deve a extraordinária pulsação cromática de suas obras.

Nas pinturas que se referem ao mundo interior destacam-se, por um lado, janelas, portas, corredores e passagens iluminadas que conduzem ao mundo exterior e, por outro lado, espelhos que, por sua faculdade reflexiva, evocam a possibilidade da introspecção, ou seja, de uma interioridade ainda mais profunda. Aliás, observe- se que, também nas telas referentes ao mundo exterior, encontra-se – nos reflexos luminosos das superfícies líquidas dos mares ou lagos que contêm – a sugestão da autocontemplação, isto é, de um retorno ao mundo interior. Temos assim um incessante retorno do mundo exterior ao interior, e vice-versa. O fato é que a pintura de Marcos Duprat (pondo entre parênteses a apreensão meramente instrumental e utilitária do mundo que domina nossa vida cotidiana) convida nossa imaginação a não apenas passear pela superfície de suas telas, mas a mergulhar nos seus diáfanos corredores, espelhos, passagens, lagos e mares.

Antonio Cicero Lima
Rio de Janeiro, 2018

Marcos Duprat é um dos raros artistas de sua geração com erudita formação. Transita entre a pintura e o desenho agregando, sempre que possível aos seus trabalhos, suas lembranças e experiências. A exposição Memórias sobre o papel celebra os seus quarenta anos de carreira e apresenta desenhos, pastéis e aquarelas. Suas obras pulsam e transmitem poesia.

Marcos Duprat experimenta novos materiais e texturas, distorce os espaços com maestria, devolvendo ao espectador uma composição plena de elementos, com luz própria, que nos convida, muitas vezes, a mergulhar no espaço. Cada obra possui a sua identidade, sua escolha e, acima de tudo, sua pujança lírica.

Os nossos agradecimentos a todos que tornaram possível a realização da exposição Memórias sobre o papel, de Marcos Duprat, autor de uma obra construída com rigor e profundo sentimento humanista.

Sejam bem vindos!

Monica F. Braunschweiger Xexéo
Diretora do MNBA / IBRAM / MinC, 2017

A obra do artista brasileiro Marcos Duprat é relativamente pouco conhecida em seu país.

A exposição LIMITES reúne uma seleção de 60 obras do acervo pessoal do artista realizadas ao longo de mais de quatro décadas de sua atividade criativa combinada à carreira diplomática. São pinturas a óleo sobre tela e papel, em que utiliza também pastel, aquarela e lápis, que evoluíram da figuração à abstração.

O conjunto da obra de Marcos Duprat é tributário de sua vivência singular e fecunda como artista e diplomata com o olhar atento às produções mais significativas das artes brasileira e estrangeira com as quais manteve contato direto e enriquecedor. Após sua formação artística e mestrado em Washington, D.C., os sete anos na Europa e nove em países asiáticos deixaram traços nítidos em seus trabalhos.

A exemplo de Bill Viola e Hiroshi Sugimoto, artistas contemporâneos que atuam como curadores de suas próprias exposições, Duprat é o curador da presente mostra, que a Fundação Biblioteca Nacional tem o prazer de realizar, de modo a proporcionar o encontro do público carioca com a sua trajetória criativa.

Helena Severo
Presidente da Biblioteca Nacional, 2016

Passagens

Marcos Duprat volta a expor em São Paulo após uma ausência de cinco anos. Trata-se de um reencontro desejado com o público paulista na busca de ilustrar etapas do processo de amadurecimento e transformação de sua linguagem plástica. Tem como ponto de partida trabalhos iniciais, até chegar à produção das duas últimas décadas e às obras recentes.

O artista como criador independente, é também o curador ideal de suas apresentações. Ao escolher e oferecer à contemplação aquelas obras que correspondem às passagens por ele sentidas como cruciais e determinantes no desenvolvimento do conjunto de seu trabalho, oferece ao espectador a possibilidade de participação em conjunto de seu trabalho, oferece ao espectador a possibilidade de participação em sua esfera íntima de criatividade.

Iniciada a formação artística no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro, complementou-a com o exercício da pintura e, nos anos 70, com o Mestrado em Belas Artes na American University, em Washington, D.C.

Seus primeiros trabalhos, puros e com toque de jovem sensualidade, inscrevem-se no âmbito de influência neo-figurativa, então dominante nos Estados Unidos. Diferem, no entanto, do realismo fotográfico da época, na medida em que, já então, o artista ameniza contornos, confere fluidez aos encontros de figura e entorno, e adota pinceladas fluidas. Busca exprimir, or um delicado cromatismo, o anseio de captar a luminosidade como fulcro e essência da tela.

Nesta fase, dada a circunstância de uma exigente atividade profissional, o trabalho é de ateliê, realizado nos horários noturnos, sob luz artificial e, nos fins de semana, ante janelas abertas. Duprat explora os limites do ateliê. As cores são em geral frias. Figuras humanas, quando aparecem, estão em um cerco de paredes, muros e portas. Janelas e passagens são testemunhas da introspecção criativa de retratados e retratista. Há um distanciamento psíquico entre artista e personagem, um recuo que confere à figura caráter evocativo, quase abstrato. Nos ambientes despojados, vidraças e espelhos prestam-se ao jogo de transparências, a enlevos narcisistas e à exploração do tema do duplo, de tão profundas ramificações emocionais.

Detecta-se pouca variação cromática – embora o tratamento seja rico e nuançado nos trabalhos realizados em Lima, Brasília, Milão, Montevidéu e Budapeste, cidades nas quais viveu sucessivamente.

É na virada do século XX que Marcos Duprat volta ao Japão, onde morou na adolescência. Conservava recôndita afinidade com a estética japonesa. Ali a paleta se libera e enriquece. Há uma nova ousadia na fatura, ao mesmo tempo em qeu a natureza começa a oferecer-se a seu traço sensível e delicado. A luz continua a ser tratada como elemento de articulação na criação da imagem e conduz agora a imagens oníricas e à contemplação de espaços virtualmente construídos pela cor.

O conjunto é integrado por cerca de cinquenta obras sobre papel e tela. A técnica de trabalho de Duprat é a velatura, em que a cor resulta da superposição de pigmentos em camadas. Nas telas, o meio empregado é o óleo, enquanto no papel usa óleo, pastel oleoso, aquarela e lápis.

O crítico norte-americano Ben L. Summerford assinalou haver em sua pintura “… uma qualidade que toma corpo em um espaço atemporal, no qual se testemunham não propriamente ocorrências mas o conhecimento de potencialidades…”

O trabalho em curso apresenta radical renovação. O plano pictórico compõe-se de áreas de cor em expansão, construídas por pinceladas que obedecem a um ritmo concêntrico e radial. A tensão resultante sugere o efeito de refração da luz na atmosfera e cria superfícies que evocam ou configuram horizontes e paisagens cromáticas.

Vera Pedrosa
Rio de Janeiro, 2015

MYSTERIOUS BEAUTY OF SPACE WOVEN BY LIGHT

According to Genesis, light is in the very source of Creation. In the Paleolithic age, man painted for the first time, as in the cave of Lascauxu, under the beaming light of fire. In this flickering light, animals would hop around the cave walls, and maybe that was the very first museum in human history.

Light is also one of the fundamental sources of painting. The Madonnas of Raphael, Da Vinci’s smile of the Gioconda, the portraits of Rembrandt, all these artists have endeavored to capture the mystery of light and shadow. This subject matter still prevails through the passage of time, even now, when one witnesses dramatic changes in the artistic forms of expression.

Marcos Duprat, born in Rio de Janeiro, has developed his significant career as an artist. making the core of his expression the aesthetics of images woven by nature’s gift: light. His main themes are figures, interiors, and still-lifes, which are subtly connected with each other. Water and mirrors – which appear frequently in his paintings obviously symbolize an attraction to introspection, fantasy, and aesthetic narcissism. The quiet interiors of Vermeer, Bonnard’s exuberance in his depiction of light and the somewhat haunting atmosphere characteristic of Hopper – by absorbing influences

from these artists whom he admires, Duprat explores endlessly his own transparent corridors of light. It has been four years since he came to Japan, and one anticipates in his upcoming one-man show that he has further expanded his sphere of expression by his encounter with oriental space.

Miki Kaneko
Fujyia Gallery – Tokyo, 2004

“It is hard to define the specific place of easel painting nowadays. One of the reasons for that is the current recession- in the art production market as well as in its criticism – which followed the boom of the eighties. Undoubtedly, first class artists have emerged from that period. However, it could be said that this critical acclaim and euphoria of commercial success has had a negative impact on the historical legacy of the medium of painting. The painting of Marcos Duprat, however, is free from this troublesome context. It defines its own way laboriously owing nothing to the opportunism of both fashion and the art market.

Also, it does not address the conceptual questions or the definition and role of art. The influences that come from the past – especially those of Italian post-impressionism – are not related to the academic connotations of post-modern classicism. Those influences are, in fact, used fully, as authentic tools for an intensive personal search. The critics are right to point out light as the leading element of this plastic universe. I would add that light is the very substance of Duprat’s pictorial space. All the magic of these paintings is the possibility of entering illusory spaces which unfold beyond the surface of the canvas. In his series of works “Passages”, the mystery of space is free from any prosaic detail. It is not the homogeneous and centralized space of classic painting, but, as the title suggests, the experience of a passage to a region of indefinite borders. One space leads to the other, and then that one to another … The open doors show as much as they hide. They almost stand as a symbol of vision, or of desire, always oblique and fragmented … “

Valéria Gonzales
Fujyia Gallery – Tokyo, 2004

Day Dream

Marcos Duprat is a gifted man. He has one visage as artist and another as a diplomat.

Regardless of the fact that neither of these are easy tasks, I would say he is an exceptional example of having pursued simultaneously and yet steadily two different lives. The secret of his development as a professional artist as well as a diplomat is that he managed to bridge two fundamentally· different worlds: civilization and culture.

The pursuit of rationalization and evolution in a civilized society organized in different nations and the expression of emotion and individuality through art do not in any way appose or conflict with each other. On the contrary, it is possible that these two activities interact with each other to produce a substantial multiplied effect. A diplomat ‘s work is to bring together people and countries in good will. Art is not general knowledge or the ability to promote good relations.

Art is an intellectual and deliberate act of self-expression as well as a perception of one’s own life and thoughts which takes material shape. More than the usual skills of a diplomat – related to civilization – Duprat, deeply involved in his inner search as an artist, has the keen knowledge and technique of expression which ·give him access to another world, that of culture.

Let us now look at the works of Marcos Duprat. The underlying theme that permeates his work is light, time and space. This is an eternal and universal theme for an artist.

This is distinctly expressed in the series of paintings on the four seasons shown in this exhibition.

Living in Tokyo for two and a half years, the artist has been stimulated by the gentle light and the change of seasons in Japan. He frequently goes out sketching nature around the area of Shiroganedai where he lives. Duprat has a natural preference for glowing colors and fills the canvas with light almost to the point of its saturation, which may, at a first glance, lead to impressionism. However, when one observes carefully, in spite of the intense play of light and shadow, the material existence of the painting is ethereal, with an almost atmospheric qualify, and the harmonious co/or scheme is evenly orchestrated. The artist has referred to Bonnard and Morandi among his main sources of inspiration. Indeed the technique of “valuer” – or “velatura”, the superposition of several layers of paint – the use of light and shadow and the composition show the influence of these painters.

The world created by this artist is all an illusion of a subtle reality extended beyond a transparent film. Or is. it more  appropriate to call it a day dream? The artist has worked extensively with photography along his career. The work of cutting off and clipping images into frames is perceived also in his oil paintings. That can be seen as much in the still lives, influenced by Morandi, painted in divided frames, as well as

in the trees in the garden, seen through the window frames. Photographs are also called pictures of light whose contents of expression vary with the strength of its radiance. The surface of the water or the shapes of fish in water drawn by the artist are as though light has penetrated the lens. as if light itself has been permanently set on the canvas.

Marcos Duprat also shows interest in architectural spaces. He has produced a considerable number of interior scenes characterized by vertical lines, which accentuate the feeling of passages, spaces that extend from the foreground to the very depth. In spite of the geometric composition, there is nothing executed with rigidity and the lines are drawn with a free hand. Considering the artist is essentially a colorist the paintings might tend to be intensely and heavily colored but in this case. they are strangely and mysteriously luminous.

That happens because of the light, which comes in through open doors and windows, as well as the expanding outside space. where the breeze blows. The artist has mentioned that, since his arrival in Japan, he has been attracted to horizontal compositions, which developed as he became progressively involved with Japanese natural features. This may be related to the concept of Japanese nature and gardens. The works exhibited’ this time reveal contrasting concepts such as nature and artificiality, straight lines and curves, light and shadow, East and West. the unseen presence of someone and a sense of solitude, which comprise the charm of his work.

Artists. in fact – more than “professionals”, as mentioned previously – may be people with a fine sensitivity and a longing for solitude.

Takeshi Kanazawa
PromoArt Gallery – Tokyo, 2003

Acompanho o desenvolvimento da obra de Marcos Duprat. Desenho e pintura são os meios de expressão plástica dos quais o artista se serve, sempre pautado pela observação e apurando a qualidade das técnicas que usa. A fotografia exerce também um papel significativo em sua obra, não propriamente como referência direta para o desenho, mas como registro de memória, depois trabalhado e filtrado pela emoção do artista.

Os interiores são o seu enfoque preferido. Ele monta cenas da vida cotidiana com apetrechos diversos e com personagens, vez ou outra, apenas insinuados por metonímias. Cada elenco de obras representa parte de um discurso plástico que se sedimenta a partir da leitura de todos os quadros da exposição que configuram um sentido e um rumo explícito.

A mostra atual aborda a importância significativa da luz na representação plástica. E ela se diz presente e

transformadora das cenas dos quadros através dos espelhos, reflexos, transparências e da sua imagem incorpórea. Cada um desses agentes intervenientes tem força ilimitada e sofrem a interdependência da visão do espectador.

Em primeira instância, as cenas, ou seja, as pinturas, compõem-se de formas, volumes e cores que estruturam o espaço das composições plásticas. Num -segundo momento, a luz transformadora, criada pelo artista, ocupa o espaço da tela com grande energia, levando-nos a avaliar quão voluntariosa e invasora ela é ao penetrar na área pictórica. Certo que ela ocupa as cenas com o propósito incomum de desarticular e desconstruir a composição já existente. Trava-se um jogo ótico entre o corpóreo das cenas e o incorpóreo da luz. E assim, o artista esborrifa grãos de luminosidade sobre os volumes, cadeiras, mesas, portas e janelas, criando uma interação entre o visível e corpóreo e o devir a ser do visível e incorpóreo da luminosidade, aderente, fugaz, ao mobiliário represado nos interiores.

Como personagem central da pintura, a luz insinua ao visitante uma relação amorosa e condicionante às coisas. E, por que não aos homens? E aqui cristaliza-se o mistério exposto na instalação Limites que, para ser realizada, requer a presença do espectador debruçado sobre seu espelho de vidro, observando a simulação de água e as pedras que jazem no seu interior. Para existir e ser apreciada, a obra exige luz. E interdependente dela, incorpórea e agora não dependente da mão do artista. Apesar de corpórea, a instalação, para ser vista e fazer-se espelho, precisa da claridade natural ou da elétrica.

Desvenda-se o mistério. O espectador vê a sua imagem refletida na superfície de vidro. Questiona-se. Seria ele uma obra de arte? Questiona-se da mesma forma que Marcos Duprat, ainda menino, saindo do colégio e aguardando o ônibus sob a chuva, viu, de repente, a calçada cheia de buracos e uma poça d’água reproduzindo o céu azul e a luz do sol dourando tudo. A água é também espelho da criação.

A compulsão de trabalhar os mistérios da luz acompanha a trajetória artística de Marcos Duprat. São quarenta anos de desenho e pintura. Muitos dedicados à relação com a luz, no seu mais amplo espectro. Trabalhou com modelos-vivos, refletidos nos espelhos, o céu, o mar, a natureza morta e a figura. Remetia-se àquilo que se diz realidade aparente, preferindo-, contudo, dar asas à própria imaginação. Desenvolveu-se nas técnicas da pintura e do desenho, capacitando-se na engenharia dos estilos que

compõem as suas cenas pictóricas. Conviveu com as tendências artísticas da pop art, arte conceituai, land art e de outras tantas artes, preferindo seguir seu caminho de pesquisador das cores e da luz, buscando reencontrar o fio da meada do seu encantamento de menino – a imagem do céu azul e do sol refletidos na poça d1água -.

Rahda Abramo
CCBB – São Paulo, 1999

MARCOS DUPRAT UN MAESTRO DE FIN DE MILENIO

Marcos Duprat (Rio de Janeiro, 1944), es un notable artista plástico brasileño, desconocido en Uruguay, pese al vínculo estrecho que nos une al vecino país, a través de la Bienal de San Pablo, creada en 1951, y desde hace dos años de la 1ª. Bienal de Arte del MERCOSUR en Porto Alegre.

Su lenguaje está muy distante de los grandes creadores que se sucedieron en su país natal a lo largo del S.XX: Portinari, Antonio Henrique Amaral y el “Tropicalismo”, Marcelo Grassman, etc. y todas las vanguardias que les siguieron e irrumpieron no sólo en Brasil sino en toda Latinoamérica y en nuestro país sobre todo a partir de las prédicas del maestro Joaquín Torres García, y posteriormente de los geométricos José Pedro Costigliolo y María Freire.

Duprat es actualmente Cónsul General y Ministro de Brasil en Uruguay. Su condición de Diplomático lo llevó por distintas regiones del mundo. En 1966 le toca como destino Japón y allí realiza un Curso de Dibujo con el tema de la figura humana en la Universidad de Waseda, Tokyo.

Entre 1974-77 cursa una Maestría en Bellas Artes en The American University, Washington, D.C.-EE.UU. Tal pasaje por los diferentes continentes y culturas le posibilitó estudiar el rute universal, lo que contribuyó a la elaboración de un lenguaje muy personal.

Sorprende el arte de M. Duprat en un mundo inundado de “Instalaciones”, de “Arte Conceptual”, de “Arte por computadora”, de “Intervenciones” y “Happenings” con sus enormes telas pintadas al óleo que tienen como tema central la figura humana y la luz.

El primer deslumbramiento al enfrentarnos a sus cuadros resulta de esta última que inunda la mírada del contemplador y lo sobrecoge.

Uno de sus motivos centrales lo constituye el desnudo tratado con absoluto ascetismo, enfrentado a espejos, puertas siempre abiertas, ventanas y escaleras por las que irrumpe la luz, símbolo de esperanza, de apertura y paz.

Se reiteran en otras series los temas del agua, la tierra, el cielo y el aire. Los muros son siempre metálicos o vidriados en los que se refleja la imagen del hombre, asexuada, apenas una leve curva denuncia un cuerpo femenino, pero de una enorme euritmia, en actitud de autocontemplación.

Pese al aislamiento que denuncian sus estilizados cuerpos, revelan esperanza en la actitud distendida y expectante, siempre enfrentando la luz, sin angustia, serenos y plácidos, denunciando plenitud y paz.

Los pisos con sus líneas rectas perfectas en fuga, sugieren la profundidad en los espacios abiertos.

Su gama cromática es apastelada; trabaja el óleo en capas superpuestas logrando transparencias de una sensorialidad excepcional y una riqueza sobrecogedora.

Se declara Duprat adepto al “realismo simbólico”, pero mucho más importante que saber si puede inscribirse en algún movimiento contemporáneo, es descubrir la total originalidad que logra al ofrecer al espectador una cosmovisión plena de luz con imágenes humanas todo armonía y euritmia, que apuntan al rescate de la esperanza, en un mundo obsesionado por el consumismo, por los intereses materiales, despiadado e indiferente ante el espectáculo cotidiano de la violencia, de un enorme sector de la humanidad oprimida y desfallecientes por la hambruna y las guerras focalizadas que ofrecen una única salida: la muerte.

Las telas de Marcos Duprat desbordan luminosidad. Sus desnudos avanzan hacia un nuevo amanecer de la historia.

Afirma George Kubler en su libro: “La configuración del tiempo”, que: ”Todo artista importante revela una obsesión” y agrega que: “El más extraordinario innovador es funcionalmente un solitario”.

Marcos Duprat es ambas cosas confirmando así su condición de creador de primera magnitud en este último cuarto del siglo XX.

Prof. María Luisa Torrens
Directora del Museo de Arte Contemporáneo – Montevidéu, 1999

A atual fase da pintura de Marcos Duprat centra-se em recortes cenográficos de interiores da casa, ninho de morar, de viver, penetrados pela narrativa simbólica da luz.

O sol, erótico, energético, vindo de fora, trespassa a janela, jactando-se dos seus pigmentos amarelados esborrifados sobre o ambiente, destacando-se dos equipamentos, pisos objetos e demais componentes formais contidos nas telas onde surge, ocasionalmente, a presença humana.

Ressalta a pintura vigorosa das obras expostas no Escritório de Arte Renato Magalhães Gouvêa. A densa fatura pictórica exibe o rastro das pinceladas decisivas, determinadas e reveladoras da tensão e do ímpeto criador.

Vale salientar que as telas compõe-se de fragmentos de um mesmo interior e de alguns detalhes destacados das respectivas zonas picturais dos referidos fragmentos. Todos são perpassados pela luz solar, por diversos ângulos. Não se repetem. Cada um registra vistas parciais, determinados apetrechos de mobiliário e partes do desenho da arquitetura interna.

Representam segmentos do olhar do artista sobre o seu próprio ambiente de morada. Esse olhar explora, inquire e resgata as diversas áreas que compõem a totalidade do espaço da casa, concedendo à luz o papel de fiel invasor e, pour cause, o do mais importante dos personagens da sua pintura.

A mostra de Marcos Duprat trata especificamente da pintura, dos seus recursos cromáticos e, naturalmente, do seu desenho subjacente estabelecendo limites para a composição do espaço.

Nas telas, em convivência aparentemente contraditória, porém vital, confrontam-se e realimentam-se, reciprocamente, a composição construtiva dos interiores da casa, linhas essenciais do desenho e detalhes da sua arquitetura interna com a derrama pictórica dos pigmentos amarelos, quentes e eróticos da luz do sol intermediando uma relação entre o universo cósmico, aberto, de fora e o universo circunscrito, delimitado e fechado da moradia.

O ato criador, invariavelmente, surpreende o artista. Nesta história, ele seria apenas um condutor do embate entre o raciocínio e a sensibilidade artística, pois, no percurso da criação e execução das obras, a massa de luz invadindo a composição construtiva das telas tem o potencial de desfazer a precisão dos traços. Nesse belo e ousado paralelo se dá a presente manifestação artística de Marcos Duprat, transgressor da própria linguagem expressiva e em busca de sua maior amplitude e profundidade.

Radha Abramo
Renato Magalhães Gouvêa Escritório de Arte – São Paulo, 1998

“For over two decades now, since the fatigue of abstractionism, the paradigm of Western painting has returned to the image. To the image that is violent or placid, impersonal or portrait-wise; hence the triumph of Bacon or Balthus, of the hyper-realists or of Lucien Freud. But, as wisely warned by those who first denounced the exhaustion of abstract art, the return to figuration can only be consistent if it builds upon a new rigour in technique and composition. In recent Brazilian art, none embodies such a rigour more thoroughly than Marcos Duprat.” – writes J .G. Merquior, Duprat’s domestic critic, in the catalogue of the painter’s 1990 exhibition in Milan. I believe this statement can be accepted as a starting point and a basic principle, in the process of understanding the Brazilian painter’s art on the occasion of his Hungarian exhibition. If one would surmise a slight contradiction between the clear objectivity of the sentence quoted and the notion of mystery, let me add immediately that it is, by far, not a contradiction. In fact, the multifaceted character of Duprat’s paintings is the result of the most divergent influences.

These sources range from the European classical tradition – through last century’s romanticism and its consequences in the twentieth century – to the latest tendencies, in which a pure and rational determining principle is the basis for the development of an enigmatic world concept. Concerning my former reference to romanticism, it was Delacroix who said, that in painting one could penetrate the mysteries of human passion only through learning and applying a sound and rigorous technique.

The mention of Vermeer as one of Duprat’s classic foregoers is not accidental. The analogy is quite right if one considers the Dutch master’s extraordinary intellectual clarity and austere humanism, his orderliness and meditative inclination, as well as his moving sensitivity towards the image, among the main features of his unsurpassably rich and exact technique. Criticisms of Duprat’s work searching out for further analogies, also mention Balthus subjects, except for its dark overtones, as the ones with more affinity to the nudes of the Brazilian painter. J.G. Merquior, quoted above, compares the atmosphere of Duprat’s representation with the “lyrical silence” of Morandi.

The Museum of Art of Sao Paulo held exhibitions of Duprat’s paintings in 1979 and 1988. In the former, the artist was introduced by two well-known critics, Vera Pedrosa and Carlos Rodriguez Saavedra. Both pointed out that, in the seventies, American hyperrealism, the immediate successor of pop-art, had a vigorous effect on the art of the Brazilian painter. That happened at a time when representation of the human figure followed new ways; the originality of Ouprat’s paintings stood out by means of an absolutely individual element: the joint interpretation of the figure and its own reflection. At that time, Saavedra wrote of him: “In Marcos Duprat’s painting representational values are meant to decode those which are non-representational. The visible foresees the invisible, the sensual discovers the spiritual. The painter’s language has mainly three signs: the organic, the abstract and the transparent. The first is the human figure, the second is the construction where man lives, and the third is light.” In 1990, the painter organized the elements of his art into a geometric scheme which can be interpreted as a constructive summary of his creator’s goal. The following elements exist in this scheme, which may be read both in its horizontal and vertical continuity: “interior, figure, still life; space, light, time; myth, reality, mystery”. The crystal-clear structure of spaces in his pictures (sometimes the only and independent subject of the painting is space itself) leads us to believe that classical constructivism has also been a major influence in Duprat’s art. Getting back to our starting point: Marcos Duprat, during his artistic education in Brazil, Japan and the United States, through deep studies of the old and contemporary masters, has acquired the necessary tools to create a new, -severe technique and composition, by means of which he embarked on a quest of new visual interrelations. Through the affectionate and sensitive illustration of the image, he has penetrated into the concealed world of human feelings. In spite of the often increasingly anarchistic character of today’s art manifestations, art history shows that true development has been always built on the common denominator of tradition and innovation: the elements discovered by earlier generations added to new ones. In Duprat’s paintings a matchless, unparalleled, individual world concept emerges in front of the spectator, the alloy of diverse influences.

This exhibition provides a selection of paintings and drawings of the last four years. Compared to his earlier work, there are signs of a certain change in these pictures, as if the artist is posing himself new questions. The leitmotiv of his art is still lyrical meditation: the refreshing and soothing silence that rules over the nudes in crystal-clear spaces, stiffened into momentary inertness, is also present in the still lives, which evoke the notion of timelessness, and in the harmonious interplay of light and reflection. His style has become, however, freer and more expressive, one might even say more realistic, and his brushwork has acquired a thicker, more perceptible quality. This change is especially prominent in his portraits, where one has the feeling that the tranquility of meditation has been jarred by an external, inconceivable emotion. The art of Marcos Duprat questions the past, the present and the future, on the thrilling edge between reality and mystery.

Géza Csorba
Deputy General Director – National Gallery of Hungary – Budapest, 1992

Explicitly linked to visible reality, to describable appearances, the paintings of Marcos Duprat, in all of those last years’ works, seem to constrain the viewer to a curious attitude of “mistrust” when in confrontation with those objects, places and figures presenting themselves in a fastly recognizable way, almost obvious in its directness and thematic clarity, and even in its depiction of the simplicity of daily life.

This becomes clear in every image, and even more so because each is a variation of the same subject, an objective exact “reference” being searched for the original motif of this whole sequence of pictures and, I suppose, for the final goal which it hopes to achieve in its transition from reality to fiction. Therefore the compositional rigor, the solidness of the bodies, the strong plastic sense, in short, the respect for the rules.

On the other hand, rendering enigmatic not only those objects but also their placement in space, in which they seem to be absorbed – leading us to believe that these are “happenings” captured in a second by the eye – there is very evidently an extraordinary lightness of treatment, an effusion of light that tends to shadow, partially disclose and finally disintegrate those objects and bodies, as if showing only their transparency. This is taken so far as to make the viewer suspect that those full. intense, male and female bodies, proudly placed in often misleading and complex architectures, multiplied within a rigorous sense of perspective, are nothing but a pretext to enhance their surrounding space and its leading role in these images.

In fact one ultimately finds out that without those figures, not at all strange to and never “stranged” because of their very belonging to and similitude to those spaces, the architecture would not be able to express the intentional ambiguity of those images.

It is for that very reason that Jacob Klintowitz in his essay, insisting on a “game of doubles”, on a “continuous confrontation of two parts”, has defined Duprat’s method as an “invention” of truth, which testifies for the creation of a “real” unreality, or, in other words, fiction. It is not by chance that Rodriguez Saavedra tries an even more subtle explanation: the representational values – to which Duprat does not resign in spite of running the risk of too literal a reading of his work – are tools for the decodification of the nonrepresentational values. Further more: “the visible foresees the invisible, the sensuous reveals the spiritual.”

In fact, the eventual borrowing of symbolist devices does not ever go beyond the domain of the figurative, of the visible appearances. On the whole, one seldom comes across the depiction of a “super-reality”, through distortion of the forms, “expressiveness” of the figures or a false perspective of the architecture. In what concerns the works’ titles, the concept of reflection results even more appropriate, as well as more coherent with the nature of the paintings, when it is not expressly brought up. In fact, the theme, with all its shades of ambiguity is also recognizable when the artist deals with figures in water, water and rocks, interiors with statues and columns, and eventually leads us to the metaphor of the interiors, of the objectiveness of visible elements, swiftly apprehended by the senses. And which, in its own turn, is misleading precisely because it is related to tangible matter.

Maybe Duprat’s true compositional “playing” is not that of setting “doubles” but reaching out to a sort of multiplicity which works out as a continuous exchange of the parts, in such a fast transformation that the eye perceives it as absolutely static. The sense of time – the perception of the concept of transition, openly stated in so many Passages, in indefinite ways inside-and-outside (or enclosure-and-opening), a concept reinforced by the hallucinating sequence of doors, windows and corridors, where a body, a statue or a still life are each nothing but another different “presence” – is finally enhanced through the handling of that effusion of light, which simultaneously reveals and hides. This sense of time is recognizable, in other cases, such as in those of the sets of repetitions of the same image with slight variations of color and placement, scanning the space through photograms, as parts of a puzzle, and also, in other images, through the fragmentation of the same object, sometimes in the horizontal sense (as in the case of the movement of clouds and waves), sometimes in a concentric sense, always simulating truth but projecting it beyond. As if each moment was nothing but a prefiguration of the next one.

If the earlier foundations of Duprat’s work, as pointed 0ut by P.M. Sardi, should be traced back to the “domineering current of hiper-realism” and the “influence of photography” in his formative years in New York, during the seventies, nowadays the direction towards which his figuration is taking, with an ever increasing drive, is that of a sort of new metaphysical language.

Roberto Sanesi
Centro Culturale San Fedele – Milano, 1990

Há pelo menos duas décadas, com a fadiga do abstrato, o paradigma da pintura ocidental voltou à imagem. A imagem violenta ou plácida, impessoal ou retratística: daí o triunfo de Bacon ou de Balthus, dos hiper-realistas ou de um Lucian Freud. Mas, como advertiram os primeiros denunciantes da penúria do abstracionismo, o retorno à figuração só ganharia consistência se passasse por um novo rigor da técnica e da composição. Na plástica brasileira dos últimos anos, ninguém encarna esse requisito com mais consciência do que Marcos Duprat.

Tranquilamente, alheio ao frenesi neofágico das propostas vanguardeiras, Duprat se refugiou na mais estrita fidelidade ao que ele chama “o enigma da realidade visível”. Esse enigma, os óleos de Marcos Duprat o armam, decifram e rearmam num estilo translúcido, cristalino, onde as mudanças cromáticas sugerem momentos de mágicas metamorfoses. Os planos são dispostos, as camadas superpostas, a cor nasce da “velatura” – um processo colorístico de nobre linhagem, que exige um trabalho em ritmo artesanal, a léguas da herança turbulenta, e ainda tão influente, de Pollock e sua tribo. Uma pintura lenta, em adágio, propícia à meditação do duplo, à ponderação da série, à perquirição da profundidade – todos temas desses óleos peritos em focalizar o prolongamento de uma imagem noutra, o reflexo no espelho ou na água, os corredores engavetados em túnel, a delicada modulação de sequências.

Quando ele aborda a figura humana, especialmente nua, Duprat sabe ser tão sereno quanto Balthus – mas sem fazer da cena o prelúdio a um drama de vício e malícia. Quando prefere objetos, o silêncio das formas é tão lírico quanto um Morandi. Suas paisagens – céu e mar, luminosamente brasileiros – tendem a uma   harmonia glauca, banhando um equilíbrio de massas leves. Invariavelmente, a tridimensionalidade nele se resolve em fundos de estilizada geometria, estruturando máximo a felicidade da figuração. Vários retábulos, dípticos e trípticos insinuam certa volúpia na transgressão de limites, logo apaziguada na musicalidade de um espaço suave, acariciante, sublinhando a elegância cursiva do desenho. A luz reverbera nas sombras, um canto do mundo oscila no claro perfil de uma visualidade ambígua, sala, quarto, estúdio esplendem numa espécie de Vermeer meridiano e etéreo, seixos e nuvens avançam e recuam, efebos e “koires” se agacham ou se deitam, imersos em si mesmos – e no seu espelho, real ou imaginário. Plena poesia da imagem, pintura personalíssima, onde o extremo, sábio despojamento encobre um diálogo constante com a melhor tradição figurativa. Marcos Duprat restitui nossa pintura ao reino sedutor da representação articulada, fonte de sonho e devaneio. O visível se faz mistério à força de claridade e transparência. Calmas e límpidas, essas imagens se/nos interrogam. E que é a pergunta, indaga um mestre, senão o desejo do pensamento?

José Guilherme Merquior
MASP – São Paulo, 1988

Se eu tivesse que contar as exposições que apresentei até a data de hoje, poderia fazer uma antologia de quase todas. as tendências que dominaram este século. Digo tendências para indicar também as suas variações: um surpreendente conjunto de formas de expressão nos campos da pintura e da escultura. Recordo que, quando nos anos 20 expus Carrà e Soffici na minha galeria de Milão, tive a intenção de organizar a mostra incluindo as suas experiências no futurismo; tal não foi possível porque os dois mestres não aceitaram a ideia de mostrar aquelas suas fases anteriores. Voltara a ser apreciada a pintura que mostrava verdades e realidades interpretadas à maneira do início do século vinte italiano, época em que se apreciava Giorgio Morandi como o artista da atualidade, e os meus dois convidados não davam mais importância às investigações de Marinetti. Desde então, primeiramente na minha sede milanesa, e posteriormente, após a guerra, na direção do Museu de Arte de São Paulo, foi uma sucessão de exposições, do metafísico ao informal, do concretismo ao surrealismo e, através de tantas outras novidades, fui acompanhando os tempos, especialmente em São Paulo, onde a diferenciação de estilos vem-se impondo já há quarenta anos, recrutando pintores e escultores não só entre os sequazes do chamado academicismo, mas, também, nas fileiras dos que ingressam na arte porque está na moda.

Há pouco, de passagem por Milão, tive a ocasião de ver as novas pinturas do artista brasileiro Marcos Duprat que, como eu já sabia, se dedicava ao figurativo, forma de pintura que recentemente vem sendo objeto de maior atenção e polêmica em confronto com uma certa facilidade que pode caracterizar o abstracionismo. O MASP dedicou em 1979 uma exposição a Duprat. Os críticos que apresentaram o artista foram Vera Pedrosa e Carlos Rodriguez Saavedra. Vera apontava o início de sua formação durante a permanência, ao longo dos anos 70, nos Estados Unidos, quando a tendência predominante era do hiper-realismo, que andava sucedendo as experiências do “pop”. Eram, então, valorizadas as implicações da arte fotográfica; dava-se valor não bem ao figurativo-figurativo, mas ao figural, isto é, à figura representada numa nova situação. O dado original do estilo de Duprat foi de optar pelo reflexo da figura na água e nos espelhos. Rodriguez Saavedra escreveu: “Na pintura de Marcos Duprat, os elementos representativos servem para cifrar – e decifrar – os não representativos: os componentes visíveis adivinham os invisíveis, os sensuais descobrem os espirituais. A linguagem que o pintor inventa tem três signos: um orgânico, outro abstrato e um terceiro translúcido. O primeiro e o corpo humano, o segundo é a construção habitada pelo homem, o último é a luz.” As duas observações são corretas. Nos anos seguintes o pintor perseguiu sua vocação, dando prova de uma reflexão mais intensa, como se pode constatar no grupo de meditados desenhos, preparação para enfrentar as composições em pintura. Neste desenhar, o estilo de Duprat esclarece sua cuidadosa atenção para com a realidade das formas.

Nos meus tempos classificaria a pintura de Duprat mais simplesmente com o adjetivo interessante, naturalmente de fácil comunicação, considerando que o artista almeja ser compreendido por aqueles que pretendem descobrir na sua obra, digamos assim, uma temática. O Duprat pertence a essa categoria. O que ele me mostrou recentemente em Milão confirma suas intenções: estender à tela os próprios pensamentos, voltados ao poético, em composições onde a natureza denota o seu valor. Em algumas dessas obras, o artista compõe paisagens e naturezas mortas, seccionando-as em quadraturas. Uma composição atraente e rica de efeitos. Tendo chegado a este ponto, só poderia acrescentar uma sucessão de adjetivos. Mas prefiro reservar essa incumbência aos visitantes da atual mostra que acolhi nas salas do MASP.

Pietro Maria Bardi
MASP – São Paulo, 1988

It has been my privilege to have followed Marcos Duprat’s development in painting since he took it up as his chosen way of vital expression. That is, since he undertook it with the seriousness and dedication· of a professional artist.

Often I would go to Duprat’s studio to talk about his painting. Years have gone by since then and during this time I have not seen the evolution of his work. Now, as his second one-man exhibition in Washington D.C. approaches -this time at the Art Gallery of the Brazilian-American Cultural Institute- I see it through the distance of time, after a long absence.

His work has grown, has entered more definite channels. It has become freer, more sure of itself and has gained in depth. Marcos Duprat takes a deep dive in his work and surfaces again as a figure in one of his recent paintings. He brings back the assurance and the certainty one derives from the deep. He also comes up with new questions raised by the ripening of his experience and which are a prelude to new developments.

Throughout these years, Marcos Duprat has basically kept to the same subject matter. Nevertheless, his themes reemerge now with an enriched formal and chromatic structure -a change which can only be brought about by hard and concentrated work. The monologue sustained by his solitary figures facing the cosmos would inevitably demand the expansion of the physical space of the painting itself, and the canvases have consequently grown in dimension. The larger painting surface has created new problems which challenge the artist. The repeated duplication of the image and its reflection has called for the duplication of symmetries, now in the tangible dimension of diptychs.

These diptychs tend to transform the nature of borders, allowing for the possibility of a sequence in a physical and mental space. In this dialogue, one part is always the answer to the question introduced by the other: the divers submerge but they will return; the nudity that faces shadows is rewarded by light.

The variations on the theme of physical reality and its metamorphosis into the reality of the mirror image, embodied in Narcissus, are now taken up as notes of a melody that evolves on a staff provided by the whims of sea waves. These watery forms are in their turn firmly subjected to the artist’s own rigor and discipline. It is through this discipline that the artist sets the proportions of windows separating some of the reclining figures and the skies they contemplate. In this same way he creates the mirrored checkered floors where other figures move, the undulating underwater mosaics or yet the metaphysical frames of unexisting mirrors.

The artist works exclusively with oils, which gives his paintings a great variety of tones in the treatment of color and light, due to the benefits of slow drying. Marcos Duprat succeeds thus in setting his characters on a threshold, endowing them both with sensuality and modesty. Through the immateriality of earth, the clearness of water, the purity of atmosphere and the transparency of light, he offers them ideal conditions of expression in an unpolluted world, where life itself can breath and expand freely. This is the reason why his interiors have no ornaments and his figures are nudes. Figures, and not people, because they are not specifically anyone; because, in an abstract and general sense, they are everyone, the human being in search of identity and expression in a possible world.

Jose Neistein
BACI Art Gallery – Washington DC, 1980

EI arte de nuestro tiempo – en especial la poesía y la pintura – alimenta sus creaciones con lo imaginaria, lo real y lo subconsciente. (André Breton advirtió desde el primer momento la existencia de un punto en el que cesan las contradicciones establecidas por la razón formal, pero la pintura surrealista se empeñó en ilustrar esa doctrina, olvidando que, según el mismo Breton, una obra de tesis es como un regalo en el que se deja marcado el precio). Las obras de arte han sido siempre, por lo demás, la suma de los contrarios. Las paradojas integran en una expresión lógicamente aprehensible elementos aparentemente opuestos, extraños o dispares.

La obra de arte es, en ese sentido, una paradoja. EI artista ata en ella los cabos opuestos, revela el nexo invisible, la comunicación secreta. La obra de arte es un artificio que demuestra la verdad.

En la pintura de Marcos Duprat los elementos representativos sirven para cifrar -y descifrar- los elementos no representativos, los elementos visibles para adivinar los invisibles, los sensuales para descubrir los espirituales. EI idioma que inventa sólo tiene tres signos: uno orgánico, otro abstracto y un tercero traslúcido. EI primero es el cuerpo humano, el segundo la construcción en la que el hombre habita, el último es la luz. EI escenario en que se ubican estos signos es el aire, el mar, el espacio. La luz -signo transparente- integra y envuelve todos los otros.

Una obra con estas connotaciones parecería corresponder, dentro de una nomenclatura superficial, al género impresionista. Pero en el impresionismo esos elementos -cuerpo, paisaje, luz- son ubícuos, concretísimos, reconocibles y, sobre todo, agotan su ser en su apariencia. En la pintura de Marcos Duprat, en cambio, el mar es ideal; la construcción geométrica, vale decir abstracta; el hombre impersonal, de rostro indefinible. La irrealidad y la sensualidad deliberadas y contradictorias de esta pintura convergen y se resuelven en la sugestión de una imagen metafísica.

EI humano puro, el desnudo, contempla el mundo. En la quietud y en el silencio, en su soledad, el hombre se ha detenido frente al escenario deslumbrador: inmóvil, vuelto en reflexión a si mismo, está ensimismado.

Estas telas, en las que el virtuosismo del artista construye con tonos cálidos y tonos fríos una visión intelectual y resplandeciente del universo, responden a una antigua tradición filosófica y estética: la que hace de la meditación -o la melancolía- su símbolo más definido. Lo patentizan Narciso, un célebre grabado de Durero, el espejo de un autorretrato manierista. EI despojamiento ornamental y la sobriedad del gesto hacen frente aquí a la transparente belleza del mundo. Este devuelve al absorto la imagen exacta de su propio vacío. El mundo -lo prueban estas pinturas- es un reflejo de si mismo.

Carlos Rodriguez Saavedra
Lima – Peru, 1979

Nos idos de 1946, em crônica publicada na coluna As I Please do “Tribute” de Londres, George Owell escreveu (cito de memória) que a literatura absorvida na infância – e sobretudo a literatura barata – cria em nossa mente uma espécie de falso mapa do mundo, ao qual nos é dado de vez em quando recolher-nos, cartografia que, em alguns casos, se sobrepõe à realidade supostamente representada.

Trinta e poucos anos depois, a realidade parece estar cada vez mais confundida com as falsas cartografias. Para a geração que atualmente chega à maturidade – aquela a que pertence Marcos Duprat – não foi a literatura barata o que contribuiu de modo predominante para a formação de mundos ilusórios, mas (ao menos para as pessoas pertencentes a determinadas camadas sociais da civilização ocidental) foram as fontes visuais que passaram, de forma bastante rígida, a mapeá-los: o cinema, o vídeo, as suntuosas reproduções fotográficas das revistas e livros dedicados às artes, ao espetáculo, à publicidade, ao erotismo, à moda.

Num ambiente cultural dominado pela imagem – Susan Sontag discorre livremente sobre o assunto em “On Photography” – o tema do narcisismo é onipresente. É, no trabalho atual de Marcos Duprat, uma fonte recorrente de meditação. Tal imagem – a figura refletida num espelho que subitamente se parte ou no qual, de repente, aparece outro vulto – resulta de experiência vivida, foi urdida em devaneio brotou de sonho ou constitui imagem recolhida em um álbum, sequência de filme famoso? Se as figuras que ilustram os belos livros não exibem sinais de desgaste, que significa a fadiga em um olhar? Que é mais real, o reflexo ou o refletido? A que lado do espelho pertence Narciso? Existe, além de sua tênue representação, além da aparência, alguma realidade? Essas são algumas das indagações presentes na pintura de Marcos Duprat.

O artista passou a dedicar-se seriamente à pintura na década de 70. Seu acervo visual enriqueceu-se através da grande quantidade de informações recolhida durante a permanência – de anos – nos Estados Unidos. Estava então em indiscutível voga, naquele país, a fase hiper-realista que sucedeu às experiências “Pop” da década anterior. Duprat foi, portanto, exposto, em seus anos de formação, àquela tendência plástica que, na maior parte dos casos, parece haver se limitado a optar por passar uma mão de tinta sobre a reprodução fotográfica, como se, com isso, estivesse aproximando a pintura da “realidade”. O resultado dessa opção era, quase sempre, rígido e inanimado. A pintura hiper-realista, por outro lado, e salvo as honrosas exceções de sempre, tendia mais a glorificar que a criticar a civilização que a condicionava. Submeteu-se sem indagações à tirania da imagem fotográfica. Era uma pintura de aparente constatação. Como se nada existisse além dos instantes nela congelados, como se a incapacidade da reprodução fotográfica de vibrar além do instante correspondesse a uma suposta eliminação do tempo.

Embora às vezes partindo dos estímulos fotográficos dominantes do ambiente cultural em que se formava, Duprat preferiu, desde o início do seu aprendizado, elaborar um estilo sensível. Em seu trabalho, jamais esteve ausente a preocupação com a realidade e com o tempo. A pintura de seus primeiros anos é de anotações leves. A paleta é fresca e ao mesmo tempo sensual, produzindo uma agradável captação de impressões cromáticas e sentimentais.

Na fase atual, Marcos Duprat está empreendendo uma pintura de indagação. A paleta transformou-se intimista. Suas telas são estáticas, mas sem rigidez. O artista busca, sob diversos pontos de vista, explorar o tema do reflexo. É como se desejasse ultrapassar os limites da imagem, liberar-se das aparências que o prendem às falsas geografias; deter a espiral descendente que leva à absorção do ser pelo reflexo: Narciso. Suas figuras são quase sempre indefinidas, isoladas entre paredes que parecem de aço ou de vidro, retidas ante espelhos de metal ou de água. Consideram sua própria imagem, refletida em águas rasas, ou, às vezes, estão, nelas, semi-imersas. Destituídas de ornamentos, mas também aparentemente intocadas por quaisquer vicissitudes, ora parecem perdidas em devaneios, ora sugerem a entrega a uma auto-absorção sensual. Mas, em alguns dos quadros mais significativos desta exposição, encontram-se em atitude de expectativa. Estão em um limiar, talvez hesitantes diante da passagem. As portas e as janelas estão abertas, e, do outro lado, jorra a luz.

Vera Pedrosa
São Paulo, 1979

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